Na verdade, sempre estava em grupo, mas no fundo muito só, varava as
noites sem destino, gastando meus pés a esmo, sem qualquer futuro.
Não havia sentido na caminhada. Eu vagava, muda, tal qual um fantasma.
Um espectro na noite junto a outros tantos espectros, que procuravam palavras e
toques, mas que não saíam do lugar comum. Balbuciando como crianças pequenas na
esperança de um acolhimento, na esperança de sermos entendidos.
Nada mais irreal ou impossível. Uma geração de amadurecimento muito
tardio.
Talvez fruto da violência a que fomos submetidos ou mesmo da
contradição, entre a força bruta e o nosso silêncio e, a luta que tivemos que travar
contra o nosso medo e a violência que se impunha através do Estado e da
família.
Além disso, existiam as drogas. Ah, sim... muitas possibilidades à
disposição. Inúmeros jeitos de fugir de uma tomada de decisão. Mil maneiras do
capital manipular a juventude: o verdadeiro estopim para qualquer mudança.
Os outros setores estavam por demais acostumados ao silêncio e ao medo.
Neste período os trabalhadores organizados foram a vanguarda. A greve
metalúrgica no ABC foi a chave para a construção do PT e depois, da CUT. A
juventude agora tinha um norte – o apoio total e irrestrito à mobilização dos
trabalhadores. Nos organizávamos para ajudar de todas as maneiras. Dinheiro,
militantes, apoio de todo tipo.
Paralelo a isso tínhamos a bandeira da Anistia Ampla, Geral e
Irrestrita. E com a nossa juventude pueril, tudo estava combinado às drogas e
ao lumpesinato (carioca no meu caso), não era uma mistura muito saudável. Neste
viés o PDT conquistava um peso nas relações sociais no Rio de Janeiro.
Definitivamente este “quê” estudantil, impregnou o movimento dos
trabalhadores. Mas claramente o movimento já estava tomado pela classe média e
seus titubeios infantis já há algum tempo. Neste caso, o que deveria ser sim,
sim ou não, não, se torna uma discussão insuportável de intermináveis variáveis
tons de cinza possíveis, sem nunca se chegar a qualquer conclusão ou ação, o
que é pior ainda, paralisando as mobilizações.
É claro que isso não se dá de um dia para o outro. Este é um movimento
lento e gradual, que vai minando a resistência das massas aos poucos.
Esvaziando as discussões que se tornam exaustivas para as bases. Muitos dos
trabalhadores que já conhecem o álcool, passam a conhecer outros tipos de
drogas e fazem uso delas. Os sindicatos se descaracterizam como instrumentos de
luta depois de algum tempo, principalmente após a eleição de Lula.
Na verdade, tudo isso é uma sensação que guardo deste período. Agora, já
mais velha e observando com um certo distanciamento, eu me observo e vejo este
momento desta maneira. Vou guardar este relato para entender como farei esta
observação daqui há uns anos, se viva eu estiver até lá.
Quem viver saberá!